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Um captador, um consultor ou um assistente de locação desenvolve por um longo período uma rotina própria de trabalho, usando sua percepção e experiência para otimizar tarefas, em acordo com as necessidades do cliente. Mas de uma hora para outra este colaborador pede as contas, deixando não apenas um vácuo na equipe como ainda suprimindo da imobiliária a inteligência que foi desenvolvida e aprimorada dentro de casa.
É provável que todas as empresas do segmento já tenham passado por esse transtorno. Mas há maneiras de garantir que esse conhecimento permaneça na imobiliária e que os processos sofram o mínimo impacto possível com a rotatividade das equipes.
A manutenção da inteligência interna é uma das principais aplicações dos POPs (Procedimentos Operacionais Padrão), prática de documentar de forma minuciosa as mais variadas tarefas dentro de uma empresa. Imobiliárias com gestão organizacional eficiente têm adotado essa dinâmica com sucesso, como forma de elevar a produtividade e padronizar os procedimentos, em busca da excelência.
🗒️ O que são os POPs?
Os POPs podem ser resumidos como uma espécie de passo a passo das atividades rotineiras da empresa, com instruções pragmáticas sobre a forma de executá-las.
Além da importância prática para o dia a dia, esses documentos são imprescindíveis para estruturar os processos nas organizações certificadas nas normas de sistemas de gestão de qualidade (como ISO 9001 ou ISO 14001).
Em segmentos com mão de obra intensiva – como telemarketing ou as imobiliárias que atuam com locação, por exemplo – , os POPs servem como uma linha mestra para recomendar as melhores práticas, desenvolvidas e aprimoradas ao longo do tempo em consonância com a evolução das ferramentas e das metodologias de gestão.
Normalmente se faz um POP diferente para cada tarefa cíclica. Na operação de locação, pode-se adotar a estratégia para descrever procedimentos como o envio de boletos e recebimento do repasse; atendimentos de manutenção; e renovação ou rescisão contratual.
Na negociação do reajuste anual da locação, por exemplo, o documento específico para essa ocasião pode listar etapas sequenciais como checar no contrato se o índice é IGP-M ou IPCA; enviar email prévio ao proprietário avisando a taxa de reajuste a ser aplicada; comunicar previamente o inquilino sobre a taxa negociada; calcular o novo valor; e atualizar os números no sistema.
Para Rafael Aquino, product manager da CUPOLA, que aplicou os POPs em outras empresas do mercado imobiliário, a descrição deste passo a passo deve ser a mais simples possível em termos de linguagem e incorporar o “tom de voz” da marca – se mais formal ou informal. “Pode-se inclusive dar exemplos de como conversar com o cliente, de como proceder quando não se sabe uma resposta e indicar maneiras de se expressar, evitando por exemplo o gerundismo [‘vamos estar fazendo’]”, diz o consultor.
Os POPs também são capazes de agilizar o atendimento aos clientes, oferecendo aos colaboradores da ponta condições de consultar rapidamente os procedimentos sobre os quais têm dúvidas – em vez de depender das respostas dos líderes hierárquicos.
Finalizados os documentos, o ideal é concentrá-los numa pasta em nuvem (no Google Docs, por exemplo) com fácil acesso para todos os colaboradores.
🔄 Rotatividade sem drama
Na Jair Amintas, imobiliária de Montes Claros (MG) que aplica os POPs desde o final da década de 2000, o objetivo inicial era criar uma vantagem competitiva em termos de processos, diz o diretor administrativo Thiago Tolentino, responsável pela implantação na época. Porém, o benefício mais evidente acabou sendo a praticidade na entrada e saída de funcionários, diz o gestor.
“Com o documento em mãos, é muito mais fácil orientar o novato sobre como agir. Às vezes os gestores não têm a percepção exata de quão densas são as atividades, até ver a descrição do cargo e das rotinas de trabalho”, comenta Thiago.
Na Guarida, imobiliária de Porto Alegre que há 20 anos utiliza os POPs, os documentos descritivos já estão incorporados aos rituais de trocas na equipe. “Nem temos como iniciar a jornada de um novo colaborador sem esse processo documentado”, afirma Rodrigo Serpa de Abreu, gerente de Gestão e Sucesso do Cliente da Guarida. “Os padrões de processos ainda nos auxiliaram a transformar todo o procedimento em treinamentos para as pessoas, tanto da forma EAD quanto presenciais”, completa.
E a partir desse documento consolidado, a imobiliária ainda tem maior facilidade de definir seus próprios OKRs (Objetivos e Resultados-Chave, ou seja, a fórmula para descrição de metas), que determinam as atividades diárias e a gestão como um todo.
“O fato de termos nossos processos muito bem desenhados e acompanhados desde o comercial, graças à padronização dos POPs, nos ajudou na recente atualização de nossas rotinas, em que incorporamos a gestão ágil para tornar a jornada do cliente cada vez mais rápida e menos burocrática”, aponta Clara Bandeira, diretora de Desenvolvimento Organizacional da Guarida (clique aqui para ouvir a entrevista de Clara Bandeira e Rodrigo Abreu ao podcast do Imobi Aluguel).
🎯 Precisão ao passar o bastão
Outra serventia importante dos POPs é demarcar as tarefas de cada time, especialmente na transição entre uma etapa e outra. A ideia é evitar sobreposição ou vácuo de atribuições e antecipar a sequência de perguntas e os pedidos de documentação que possam agilizar o outro departamento.
É o caso, por exemplo, do final da negociação com o inquilino, em que o comercial “passa a bola” para o administrativo na transição entre o aceite da proposta e a assinatura do contrato e entrega das chaves.
“O POP já indica que a vistoria vai até um ponto, que quando chega na cobrança quem assume é o comercial, que depois de tal ponto vai para o jurídico…. A pessoa executa o que está previsto e não entra em atividades que não competem a ela”, aponta Thiago Tolentino, da Jair Amintas.
✍️ Quem faz, escreve
A descrição dos POPs é uma tarefa documental, pois trata-se da transcrição para o papel da inteligência que já está dentro da empresa. Mas a redação, validação e edição final dos documentos demandam uma força de trabalho considerável, sendo necessário deslocar quem está dedicado a outras atribuições.
Se a mão de obra for escassa, Rafael Aquino, consultor da CUPOLA, sugere que uma imobiliária inicie a descrição dos POPs pelas tarefas que apresentam mais problemas, ou onde o ritmo de trabalho não está fluindo de maneira dinâmica.
E quem deve fazer a descrição? A melhor prática é deixar a função para um voluntário de cada equipe, pois quem põe a mão na massa tem melhores de
descrever a tarefa que executa cotidianamente. “Antes a empresa pode entregar um modelo, para manter um estilo padronizado. Aí a equipe redige e um responsável pela gestão dos processos valida, ao final. Ou a empresa pode contratar uma consultoria e na sequência ir validando os documentos”, propõe Rafael.
Implantados os POPs, é fundamental encarregar um ou mais gestores de revisar periodicamente o documento para inserir mudanças, atualizações e avanços nos processos de cada área. Na Guarida, de tempos em tempos o documento é redistribuído às diferentes áreas para que as equipes comparem a descrição com a execução atual dos processos. “Ouvimos muito o colaborador neste momento porque é ele quem pega as oportunidades: um atalho de processo, uma melhoria significativa que às vezes quem está escrevendo esse documento não enxerga. A gente costuma dizer que é um documento vivo”, relata o gerente Rodrigo Serpa.
🤖 Padronizar sim, robotizar não
E se na minha imobiliária as rotinas já funcionam há muito tempo de forma automática, aplicar os POPs é de fato relevante? “Se você quiser implantar um padrão de qualidade, a resposta é sim”, diz o consultor Rafael Aquino. “Quando a empresa cresce, é fundamental que ela tenha um padrão de comunicação, e que dependa menos das características de cada colaborador”.
A descrição das atividades, aliás, tende a ser benéfica para o próprio profissional, tanto pela simplificação das rotinas de trabalho quanto pela carga emocional. Como a tomada de decisões passa a estar concentrada mais no processo, reduz-se a pressão sobre a pessoa.
O que não significa, também, que deve-se despersonalizar totalmente a execução das tarefas, o que tenderia a frustrar o colaborador. A ideia é indicar as boas práticas e os roteiros de como executar as rotinas mais críticas, mas mantendo espaço para a equipe colocar sua individualidade e exercer sua desenvoltura.
Outra vantagem para os times internos aparece lá na linha de frente, no campo de recepcionistas e responsáveis pelo primeiro atendimento. A eles, os POPs conferem o empoderamento de orientar e tirar dúvidas mais básicas, em vez de simplesmente transferir demandas.
No mais, o desafio é driblar eventuais dificuldades culturais e incutir na equipe a importância da sistematização e da obediência a protocolos em nome da qualidade organizacional.